Entrevista é interferência
Texto originalmente publicado na revista 100% Skate
@
Parteum
Toda entrevista tem cara de exercício terapêutico. Pelo menos é assim que eu me sinto quando sou entrevistado. É a história do elétron sabendo que está sendo observado. Algo muda e, como a realidade é subjetiva, quem está a responder perguntas tenta criar equilíbrio, empatia ou ordem. De alguma forma, uma entrevista é interferência. O resultado da interferência pode ser um sentimento de alívio, concordância e/ou total repulsa.
Comecei o texto falando sobre isso, pois as entrevistas dos meus skatistas prediletos ajudaram a formar a minha opinião sobre eles tanto quanto partes de vídeo e fotos publicadas em revistas. Existe uma relação particular entre o pensamento e a execução, no skate. A série de entrevista do Tommy Guerrero, principalmente os episódios com Natas Kaupas, por exemplo, me ajudaram a entender (ainda mais) a revolução que esses dois skatistas propuseram e levaram adiante no skate de rua, dos anos 80 pra cá. A mesma ideia de construção e desconstrução se aplica ao mestre, Mark Gonzales — que em 1987 já estava varando rampas de base trocada, entre outras coisas.
O skate costuma subverter regras. A subversão emana de mentes que não necessariamente atendem qualquer chamada a cobrar do status quo. Não é desrespeito, nem descaso — acho eu. É que o tecido da nossa realidade sempre teve o mesmo cheiro e a mesma cor. Alguém precisa desafiar a taxa de normalidade da nossa existência. Eu só preciso lembrar a razão pela qual me apaixonei por skate quando me perguntam. Penso que deve ser assim com qualquer skatista em qualquer lugar. Maurinho (Sabotage), falando sobre Rap, dizia que era só uma 'criatividade'. Gosto de enxergar o skate da mesma forma: um exercício de criação.